sábado, 28 de novembro de 2009

Almas Antigas



[ ao meu grande amigo Marcel ]





Se nossas Almas fossem um pouco mais jovens, viveríamos um dia após o outro, sem pensar muito no futuro. Seríamos mais inconsequentes, aproveitáríamos cada momento sem pensar. Nossa Vida, então estaria totalmente voltada para o nosso próprio prazer. Seríamos perfeitos seres bacantes, imundos e insaciáveis.

Isso tudo se nossas Almas fossem um pouco mais novas, mas elas não são mais. Em tempos remotos, elas gozaram de tudo o que lhe foi possível. Fortuna, amor, luxo, diversão e alcolismo. Em meio a tanto prazer, essas Almas jovens cavaram a própria cova.

Não obstante, deram-nos uma nova chance. Agora finalmente renascidos, novos corpos, novas mentes, mas a Essência continua a mesma.

Nossas Almas são antigas, sei que realmente são, pois ao olhar às demais, vejo a ingenuidade que eu mesma possuía. É nesses jovens que repousam todo o motivo de viver a Vida novamente.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009


E hoje, finalmente, choveu. Foi a chuva da primavera do dia 26 de novembro de 2009. Sei que isso é verdade, pois posso escutá-la de dentro do meu quarto. Cai calma, serena e ainda é possível escutar a televisão sem se preocupar em aumentar o volume. Dentro de casa, há um pouco de tédio. O mais divertido é quando estamos em qualquer lugar descoberto. Quem nunca brincou na chuva? Até mesmo quando os velhos eram menos velhos e os seres mais alérgicos já fizeram brincadeiras em meio a garoa.

Aquele que nunca brincou na chuva talvez jamais tenha nascido no planeta Terra, está aí mais uma condição para ser considerado terráqueo: tomar chuva alguma vez na vida.

E eu, pensando nisso, vou ainda mais além. Estar com quem se ama debaixo do desabar dos céus é um grande presente de Deus. Jogam as capas e o guarda chuva e entram em mais profunda sintônia com o Cosmos. Está então, sacramentado o Amor.

Borboleta



Hoje pensei em sentir sua falta, consegui chorar algumas lágrimas, coração apertou. Eu voltava para casa e em meio a estrada de terra, uma borboleta azul cruzou o meu caminho. Aí lembrei de sorrir e seguir em frente.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Imaginário


Quando estou feliz, a ponto de quase sair de mim mesma, gosto de dar partida no carro e andar por aí sem rumo. Aumento o volume do rádio e saio. Cruzo faróis, avenidas e ruas cantando. Há quem pense que sou louca. É um momento mágico entre eu e eu mesma.

Quando tocam músicas que me fazem lembrar de você, é como se naquele momento, você se materializasse no banco do passageiro. Você me olha, sorri e juntos cantamos uníssono. Tudo está bem e em perfeita harmonia. Aproveito cada segundo ao seu lado até chegar a hora de descer do carro.

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Aos meus conterrâneos


Faço versos para mim mesma. Prefiro não me iludir ao pensar que algum sujeito lerá tudo isso um dia. Mas de que importa? Faço-os para mim mesma e é isso que importa. Às vezes espero que ninguém leia isso, mas somente uma pessoa dentre os sete bilhões de seres humanos que habitam o Planeta Terra. A poesia é a materialização dos sentimentos humanos, sentimentos esses que fazem os terráqueos se sentirem um pouco mais humanos. E pensar que cada um desses sete bilhões de terráqueos ou seres humanos são existências singulares, caberiam tantas essências distintas em frascos tão pequenos? Não obstante, não há metafísica terráquea que seja suficiente para responder a essa indagação.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Síntese sem antítese


Prefiro não argumentar com pessoas convictas. O motivo é muito simples: indivíduos assim acreditam que suas idéias são absolutamente corretas, dessa forma, dispensam o processo dialético combatendo assim qualquer proposição do interlocutor, ao invés de juntos somarem pensamentos. Daí a origem de muitas discussões homéricas ou de diálogo entre surdos. Para convencer alguém, a melhor retórica é, sem dúvida a não discussão. Deixar o tempo agir ou permitir que ela analise por si mesma evita conflitos desnecessários.

Naquela estação


Hoje faz dois meses que você me deixou naquela estação. Peguei meus apetrechos para partir no próximo trem das oito. Foi o único dia que passei ao seu lado, ansiamos tanto a chegada dele e num passar frenético das horas nosso tempo se esgotou.

Não sei porque fiquei tão angustiada na hora da partida. Talvez, no meu íntimo eu soubesse que era o nosso primeiro e único encontro. E você, tão ingênuo me consolava, dizia que para encontros futuros a despedida é necessária. Engoli meu choro, subi no veículo e nunca mais voltei.

domingo, 15 de novembro de 2009

Um sabiá



Hoje nem bem cheguei em casa e minha mãe veio ao meu encontro. "Venha ver" e estava deveras contente, com o brilho nos olhos e assim me aproximei para olhar aquilo que ela desejava mostrar. Uma caixinha de madeira. Não tinha tampa e no seu interior um ninho de pano. Um passarinho. Tão pequeno e frágil. Nem as penas havia nascido no seu minúsculo corpo. Olhei para a criatura e senti uma aflição grande. "É só um filhote de sabiá" - respondeu ela em tom repreensivo e observei o modo que ela alimentava o pequeno, como se fosse sua própria mãe. Indaguei se ele havia caído no ninho e ela sorrindo respondeu que não, fora tirado de lá naquela tarde mesmo. Daí senti uma enorme compaixão pelo pequenino - tão novo e já privaram-lhe a liberdade - nisso ele esticava o pescoço para alcançar o alimento que ela oferecia. "Mãe, a senhora teve coragem de tirá-lo da própria mamãe sabiá por egoísmo?" E argumentou que sempre desejou ter um pássaro como aquele e prometeu dar-lhe amor para um dia abrir a porta da gaiola e deixá-lo voar durante a tarde e prendê-lo somente a noite. Depois de dizer isso, não a condenei mais, mas nem tampouco passou a minha tristeza. Ela desejava ser amiga de um pássaro. Desejava cativá-lo, ser amada por ele um dia, por isso é preciso prendê-lo.

Então, fiquei refletindo sobre o significado do verbo cativar. Possui uma sonoridade singular, se encaixa muito bem em poesias, sugere algo bom, caloroso e apaixonado. No seu sentido racional, lembro de um escravo preso em seu cativeiro.

Aí penso novamente no pobre sabiá - a comida nunca lhe passará longe do bico, jamais precisará se preocupar em consegui-la. Se vai comer hoje, amanhã ou depois somente seus irmãos se preocuparão com isso. Não dormira nenhuma noite ao relento, não sentirá frio e também jamais brigará com outros sabiás por fêmeas. Mas jamais aprenderá a voar. Até que ponto os fins justificam os meios?

sábado, 14 de novembro de 2009

Entre as árvores


E hoje tudo foi diferente.

Você não me viu mais sentada naquele lugar,

Lugar aquele que era somente nosso.

Você estava lá,

E pude te ver somente de longe.

Te espiava escondida entre as árvores

E você ingênuo não percebeu.

Antes eu estava sempre lá,

Passando sempre a suas vistas,

De cá pra lá,

Pra quem sabe você me notar.

Poucas foram as vezes que você se dirigiu a mim,

Era eu quem ia te procurar.

Mas a partir de hoje tudo foi diferente.

Me escondo entre as árvores

Para um dia, quem sabe

Você sentir minha falta.

domingo, 8 de novembro de 2009

Esperando o ônibus

Esperar o ônibus é um martírio,
Os carros passam,
E passam.
Os faróis estão ligados,
A chuva cai quieta,
E o ônibus não vem.

E os carros ainda passam,
E não cansam,
Seguro o guarda-chuva
Apenas espero, onde ele está?
E os carros ainda a passar...

As pessoas chegam ensimesmadas,
Também a espera de algo ou alguém,
Ou a espera de ônibus.
Carros sobem
Carros descem.
Onde ele está?

Os postes, as pessoas, os prédios,
Os carros, a fumaça, os papéis,
As janelas, os cadernos, as folhas,
E ele onde está?

O asfalto, a lama, a chuva,
E se ele chegasse?

Os cachecóis, os chicletes, a chuva
E se ele aparecesse?

Os cabelos, o vento, a garoa,
E se ele surgisse?

A mochila, o agasalho, os braços...
Se me buscasse?

O rosto, os olhares, os olhos, as pálpebras...
Se me levasse...

O abraço, o calor, a respiração...
Se me raptasse...

O cheiro, o gosto, a voz, o toque...
Se me amasse...

A pele, a excitação, o suor, seu corpo
Meu corpo, meu e seu, seu e meu e um ônibus.

Eu em você, você em mim e uma buzina.
E o ônibus? Se foi...

O enjoo



E ontem uma dor dilacerava a minha cabeça, parecia que ia raxá-la ao meio. Na cozinha o cheiro do frango cozido que embrulhava o estômago. Mas e o coração? Uma pequena fagulha de angústia, ligeiro aperto de saudade.

Até que ele apareceu. Fazia perguntas. Por que perguntas? Por que preocupações? Se não ama mais, por que se preocupa tanto? Por que insiste em dizer que não sente? Não me atrapalhe, pois, com suas certezas e perguntas. Se já não é mais o sentimento de outrota, por que me culpas se os meus ainda são os mesmos?

São somente os meus sentimentos: minha paixão, meu amor. Todos aqui dentro do peito. Prefiro não recalcá-los. Fazer resistência é pior. Por isso deixo-os no lugar em que estão, é como parar de regar uma flor. Um dia ela murchará por si só, não é preciso pisá-la.

E o mal estar? Não sei. A dor passou pela garganta adentro, me fez chorar e agora se alojou no coração. Prefiria que ela não tivesse saído do seu lugar.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Cansaço



Quando vejo a escuridão da noite sei que é chegada a hora de dormir. Momento em que o abrir e fechar dos olhos tornam-se mais difíceis, demandam maior energia daquele que teima em resistir ao próprio cansaço. Contra ele não há nada que se possa fazer. Até os homens mais fortes e poderosos desse mundo rendem-se ao próprio sono. Hitler e até mesmo um Messias não resistem a um belo travesseiro após um dia cheio de trabalho - independente da finalidade desse, sendo boa ou ruim - não há sobre a face da Terra um Anjo ou um Demônio que nunca tenha parado para descansar durante a noite.

Há ainda aqueles que teimam em ficarem acordados a noite. Mas de nada adianta, pois tem que oferecer o dia para o próprio repouso. Para saber se o corpo está vivo, basta somente o cansaço. Esse revelará com exatidão onde fraqueja a tua matéria.

Na Bolha



Gosto de brincar com bolhas de sabão.
Assopro sobre a espuma e vejo
Aperto os olhos e admiro
O voar das bolhas de sabão.

Quando estão subindo ao céu
Brilham, refletem as cores do arco-íris
E em seguida,
Estouram.

Mas não desisto.
Assopro sobre a espuma novamente,
Vejo nela o meu reflexo:
Ah, como eu gostaria de nessa bolha estar!

E de fato estou.
A brisa calma me leva.
Olho para baixo e lá está
Minha mãe acenando para mim.

Seu olhar aparentava tristeza,
Mas apenas observava o meu partir,
E eu subindo contemplava
O seu permanecer.

Sua imagem tornou-se pequena,
Mas minha visão se ampliou.
A tudo consigo enxergar,
Mas me surpreendo.

Olho ao meu redor,
Encontro crianças como eu.
Também em suas bolhas de sabão,
Acenando para suas mães.

E todos se olham e sorriem;
Conversam, contam segredos,
Soltam deliciosas gargalhadas,
Tornam-se amigos.

Fazem tudo juntos,
Até mesmo brincam.
Brincam dia e noite
Como se fossem crianças comuns.

A brincadeira é divertida
E as crianças se esquecem
Do passar do tempo
E de voltarem para casa.

11/05/2007

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Viagem pela noite adentro

Hoje eu dirigia pela noite adentro ouvindo músicas lentas. Rasgava a estrada e o faról iluminava o caminho de casa. A imaginação ou talvez a necessidade de recordação corriam mais depressa que o próprio carro.
Assim fui parar em tempos remotos, tempos esses que eu era feliz. Não há porque lamentar o presente quando se tem tudo o que lhe é necessário para a felicidade. Mas pode-se chorar de saudade daquilo que se viveu e hoje não se tem mais.
E ainda dirigindo pela noite adentro, deparei-me com o luar. Sabia que era a lua porque o céu era escuro, mas ela era dourada feito Sol. Era a lua da primavera do terceiro dia do décimo primeiro mês do nono ano do segundo milênio após a vinda de Cristo.