sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Uma siesta em qualquer lugar, num lugar qualquer



Cansado ele dorme facilmente
Em qualquer lugar que encoste
Pode ser sentado no ônibus
Ou segurando a alça do metrô.

Não descobri nada que impedisse
Não existe remédio para o sono
Apenas algumas horas de repouso
Ou um cochilo num lugar qualquer.

Estando ele muito cansado
Apaga sem querer nas cerimônias
Até mesmo no volante do carro
Aí o sono se torna perigoso.

Quando estava nos meus braços
Cansado, deitou-se ao meu lado
E dormiu enquanto eu estava la
Acordada ouvindo sua respiração.

E depois que nos separamos
Ele continuou a ser o mesmo
Dormiu durante meu desabafo
Não sabia eu se ria ou chorava.

Na dúvida, nada fiz apenas calei
E ele envergonhado se desculpou
Retirou-se. Não fez por maldade
Eu conheço bem aquele coração.

As maçãs do rosto dela


Sorrindo um riso tímido ele se aproximou e sentou no banco da praça ao lado dela. Linda garota cujo olhar era perdido. Não estava nem um pouco distraída. Prestava atenção a tudo o que acontecia a sua volta apenas com o olhar periférico, fixado numa árvore prateada. Isso provocava ainda mais o pobre rapaz, também tímido. Ele fazia de tudo para que os olhares se cruzassem. Talvez, ele mesmo desejasse que isso não acontecesse, contudo o antagonismo de sentimento que pairava naquele coração juvenil era constante.

Cansado de dialogar sem ter o olhar retribuído, interrompeu abruptamente: "Por que tu não me olhas nos olhos?" - E as maçãs do rosto dela se tornaram realmente maçãs vermelhas. A garota virou e finalmente encarou o rapaz. Fez somente por impulso, mas olhou-lhe diretamente nos olhos, quase sem piscar. Engoliu seco, agora ela não tinha escapatória.

"Não sei." - Não mentiu, todavia não lhe disse a verdade. E ela era mesmo necessária? Acho que não. E o jovem também deve concordar que não era mais necessário fazer qualquer declaração. Sorriu agora um riso de contentamento e segurou a mão da moça. Era gelada, mas havia muita vida naquele corpo. Aproximou os lábios daquele rosto macio e sentiu todo o fervor. Pensou consigo mesmo: "Como pode a mão ser tão gelada enquanto as bochechas são tão inflamadas?"

Naquele instante então percebeu o quanto era amado por aquela jovem. Não teve pressa para beijar aquela boca. Continuou acariciando e brincando com aquelas mãos frias até o fim daquele dia ensolarado.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Sexta-feira

O que se procura incessantemente numa noite fria de verão com o computador ligado sem ter o que fazer nessa pequena cidade em que o tédio anda solto na casa das pessoas que preferem sair para as ruas e bares para não encontrar com ele na forma de sono porque não desejam dormir cedo nessa noite de sexta-feira que é fria mas ainda é sexta e como é o dia que antecede ao sábado não se pode ficar em casa porque há tédio e são doentes aqueles que preferem o tédio a ficar com os amigos e uma boa cerveja ou uma dose de Red Label com muitas risadas de mulheres bonitas gargalhando alto cada vez mais alto gritando e gargalhando para além do que a corda vocal pode suportar até ela acordar no dia seguinte rouca ou até mesmo sem nenhuma voz de tanto que riu naquela noite de sexta-feira e de ressaca apenas consegue grunhir de satisfação porque achou o que procurava numa noite fria de verão com o computador desligado
O que vamos fazer hoje à noite?
O céu está cor de rosa em um tom quase lilás
O ar está frio para uma noite de verão.
A grama em volta da casa ainda está molhada
Não sei se é orvalho ou se chuviscou
Mas esse lugar tem um odor diferente
Tem cheiro de capim...
Sim, capim!
E há espécies de animais que se alimentam dele
Pobre capim...
Vejo-o ser triturado pelos dentes dos queridos cavalos do meu pai
Gordos por falta de sela
Pastam aqui e ali, sem preocupação nenhuma
Defecam cá e lá em espaços quase demarcados
Brincam e brigam entre si com pequenas mordidas
E ao nos verem chegar caminham em nossa direção
E quando nos encontram cheiram nossas mãos
Como piratas procurando o baú do tesouro
Mas na verdade são somente cavalos gulosos
Que sempre encontram cenoura e pão em mãos humanas
Mastigam e engolem tudo o que oferecemos
E ainda ficam por perto para que lhes cocemos as orelhas.
Às vezes digo ao meu velho:
"São almas caninas encarnadas em corpos de cavalos"
E ele sorri satisfeito olhando para sua criação.

sábado, 16 de janeiro de 2010

Soneto I

Ah meu Eterno Amor
Se fosse eu vosso Guardião
Sacramentaria meu corpo
P'ra tocar vosso santuário.

Afugentar-vos-ia dos inimigos
Livrar-vos-ia dos infortúnios
Velar-vos-ia durante o sono
P'ra que seguro sonhasse.

Em vossa servidora há saudade
Salgada e corrosiva
Como as águas do Mar Morto.

Eis me aqui agora
Profanada pelo doente desejo
De possuir-vos de corpo e Alma.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

A cidade sem fim

Já era fim de tarde e os raios solares ainda eram intensos. As pessoas seguiam suas trajetórias cotidianas, os adultos pelas ruas e os pequenos corriam pelos quatro cantos da cidade. Apesar da vida difícil e quase sem recursos, aqueles seres humanos ainda eram capazes de sorrir em meio ao cheiro de esgoto a céu aberto e a escassez de alimentos.
Era o dia doze de Janeiro desse mesmo ano e o relógio marcava quase cinco horas da tarde quando a terra tremeu na imensidão daquela ilha situada um pouco acima da linha do Equador. Foi tão intenso que alterou bruscamente o eixo de vida de cada ser vivo habitante desse local. Casas, prédios, construções tudo estava ao chão. Sobrou somente pedra sobre pedra e entre elas, corpos agonizantes lutando pela sobrevivência.
Enquanto a tragédia acontecia, a Terra não parava de girar e o tempo não parava de correr. A bolsa de valores não interrompeu o pregão diário e os políticos não cessaram suas maracutaias. O capitalismo não parou para assistir o esmorecer de um país de terceiro mundo. Confesso que eu mesma voltava de viagem enquanto as primeiras notícias corriam pelos principais jornais brasileiros.
Ninguém imaginaria que tal desgraça pudesse assolar a cidade, talvez um vidente, mas ainda que ele pudesse fazer tamanha previsão, não seria capaz de poupar a vida de milhares de pessoas. O tremor estava fadado a acontecer.
Pessoas de todo o mundo, em várias partes do globo terrestre então se perguntam: por que? Por que a Terra ou sorte escolhera um país tão desgraçado para um terremoto de tamanha intensidade? - Descontentes, ficaram sem respostas.
O lugar esquecido agora se tornou manchete dos principais jornais internacionais. Le Monde, New York Times, La Repubblica, El Mundo, The Sunday Times entre tantos outros que não caberiam aqui. Será que agora, acidentalmente encontraram uma forma de chamar a atenção das grandes potências mundiais? Todos se sentem quase obrigados a prestar auxílio ao país em ruínas. Somente por piedade? Trata-se de uma diplomacia política ou altruísmo verdadeiro? Não sei, somente o coração dos líderes de nações saibam responder a esse questionamento.
Não tenho dúvidas de que dentro de alguns anos vão sair manchetes nos mesmos noticiários sobre uma Fênix que nasceu pouco acima da linha do Equador. Ela inspirará força e determinação aos demais países de terceiro mundo. Servirá de modelo para muitos.

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Gotas d'chuva

A chuva se alastrou pelo litoral, mas não veio sozinha. Zéfiros soprou a ventania e Zeus ainda não contente lançou raios e trovões sobre a crosta terrestre. Nesse instante não estava em casa, tampouco não me faltou abrigo e nem mesmo companhia, mesmo que todos estavam num estado de espírito que oscilava entre o medo e o nervosismo.
Nada fiz. O que eu poderia fazer? Certamente eu pararia o veículo, mas talvez essa escolha não fosse a mais acertada. O motorista continuou a guiar o carro pela noite adentro e pela chuva afora. Fazia isso sem enxergar ao certo o que viria pela frente. O para-brisa fazia seu trabalho em ritmo alucinado. Contra a nossa direção um carro surgiu. Aproximava-se cada vez mais. A velocidade também aumentava. Nosso guia freou e passou a andar pela metade do acostamento.
Foi por pouco, mas estavam todos sãos e salvos. A chuva, entretanto não cessou. Continuou frenética por todo o caminho de casa, até que finalmente a entrada para o condomínio foi avistada. O veículo entrou mais do que depressa, agora era preciso encontrar a rua de casa. Seguimos pela principal e a chuva começou a abrandar. Agradecemos pela permissão de continuarmos a viver, isso realmente foi uma dádiva concedida naquele instante momento.
Depois de me perder em pensamentos escutei o motorista puxar o freio de mão. Desci do carro e olhei para o céu. Poucas gotas d'chuva caíram sobre minha fronte.

Flutuando . . .


Quando o mar está agitado e repleto de ondas, não perco tempo na areia da praia. Vou de encontro a ele para humildemente desafiá-lo. Às vezes, ele não tem piedade dos seres humanos que nele habitam momentaneamente e assim, lança ondas ferozes contra tudo e todos. Conversas são interrompidas e gritos surgem. Casais que antes se beijavam agora interrompem a ação. É cada um por si.

A onda estoura na direção de todos. Mães, protejam suas crianças! Ela vem forte, espumante e salgada. Alguns mergulham até sentirem que ela passou; outros permanecem de pé para senti-la bater nas costas. Há ainda espíritos mais audaciosos que gostam de pegar uma carona até a beira da praia. É um espetáculo que acontece durante todos os instantes do dia.

Quando são dias de calmaria, não há muito o que fazer. Gosto somente de flutuar sobre a superfície do mar. É quase relaxante.

A mente está sempre em estado de alerta, contudo às vezes me vejo perdida em pensamentos. É nessas horas que a consciência migra junto a ele e as lembranças são recorrentes. O que faríamos se nos encontrássemos ali, livres e por acaso mesmo após tudo que acontecera? Sem perceber acabo fantasiando situações que jamais poderiam ocorrer naquele momento. Volto à realidade ao relembrar de seus estranhos gestos e palavras. Essas nuvens se tornam minhas companheiras durante o resto do dia até serem finalmente dissipadas por uma longa noite de sono.

Em meio a maré


Sempre que viajo ao litoral estou sozinha. Não diria isso no sentido de estar desacompanhada de pessoas, mas sem a companhia de um grande amor. Por causa disso, quando estou a brincar em meio as grandes saias do mar, me vejo reparando nos demais casais que se beijam. Sei que o repúdio sentido nesse instante é uma grande pontada de inveja. Quando percebo esse sentimento ruim assolar o coração, olho adiante e vejo chegar mais uma grande onda do mar. E assim esqueço o resto.

Escarpas da Serra do Mar

Viajar pelas escarpas da Serra do Mar pode parecer enjoativo para uns e maravilhoso para outros. Tudo depende do pensamento do viajante. Se ele pensa somente nas curvas e no movimento do veículo, a náusea certamente surgirá nesse corpo. Contudo, se ele abaixar o vidro do carro, enxer os pulmões de oxigênio recém produzido pelas árvores, ele sentir-se-á renovado.
Melhor ainda se ele centrar sua atenção para além do veículo, terá a permissão de ter, diante do olhos, uma pequena amostra do paraíso terrestre. Lá do alto da serra, é possível visualizar o azul do mar e a branca barra da saia de Iemanjá. Todo esse quadro é uma bela pintura do Creador cuja moldura são as nauseantes escarpas da Serra do Mar.

sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

P'ra acalmar meu coração

Venha Amor, venha ver
Mas por favor sem demora
O pôr-do-sol está lindo
É todo laranja e dourado.
Ah que fotografia perfeita!
O céu está cinza aí na capital
Porque sei que ainda chove
Portanto, não perca tempo
E venha ver esse belo espetáculo.
Há ainda um imenso arco-íris
Rasgando o céu de fora a fora
E ao fundo as nuvens são cinzas
(acho que vieram daí da capital)
Mas se você olhar o lado oposto
Verá os raios derradeiros do Sol
Despedindo-se alegremente
No primeiro dia do ano.
Há quem diga que sem dúvidas
Essa foi a melhor forma que Deus
Encontrou para finalizar esse dia.
E realmente Ele é deveras perfeito
Em tudo que faz nesse Planeta Terra.
É uma pena que há trânsito na capital
E que o corpo físico ainda não pode
Deslocar-se tão facilmente assim,
Num curto espaço de tempo em minutos.
Dizem que nossas Almas são etéreas
São leves e puras e podem se mover
Para além do corpo denso.
Se ainda pensa um pouco em mim
Quero então imaginar as nossas Almas
Encontrando-se bem aqui
Adiante desse belo fim de dia.
E quanto o sol finalmente partir
Iremos para dentro de casa
Matar toda a saudade que ainda nos resta
Estará acalmado então o meu coração.

Camisola de Cetim


É primeiro do ano e achei melhor jogar algumas coisas fora. Confesso que arrumar o guarda-roupa nessa data é uma tarefa árdua. Há a preguiça da noite anterior e a vontade de ainda desfrutar um pouco mais do dia.

Em meio há tantas roupas escondidas, encontrei aquela camisola que trajei no dia que o esperava ansiosamente. Olhei para ela e a apertei contra o peito. Já se passara algum tempo e eu me lembro de te-la usado mais uma vez, para dormir somente. Fora lavada, não obstante, eu ainda posso sentir o cheiro dele impregnado nela.

Pensei em vesti-la nessa noite, mas não consegui. Aborrecida comigo mesma, preferi me desfazer dela.

Sonhos Matutinos


Nada mais doce que sonhar com a pessoa amada. Melhor ainda quando os sonhos se parecem reais: há gente ao redor, barulho, gosto e cheiro. É possível até mesmo ouvir a voz dele, e isso é demais! Certa noite sonhei que caminhava ao lado dele, como há tempos não fazíamos. Foi uma sensação mágica entre nós. Possuía ainda os mesmos tiques e manias de outrora, o mesmo medo do relógio e desconfiança dos que passavam.

Chegamos finalmente a uma bela praça circular e ali havia alguns bancos. Sentei-me e ele permaneceu de pé. Não hesitei e abracei sua cintura como quem não o quisesse deixar partir. E de fato ele não queria. Mas chegada foi a hora. Despediu-se de mim e para minha surpresa, estávamos nós dois com os olhos marejados. Então eu o abracei e disse que o amava e o quanto era imenso o meu bem querer. E olhando nos meus olhos, disse: " E você acha que eu não sinto o mesmo?" - Abraçou-me novamente e partiu para o longe, para aquele lugar que eu jamais poderei acompanhá-lo.